Das Dificuldades do Mercado Fonográfico
Mexendo
em algumas pastas, achei uma crônica de Arthur da Távola sobre Waldir Calmon. O
texto foi publicado na já extinta revista Amiga,
de 28 de abril de 1982, pouco após a morte de meu pai e, além da homenagem,
falava do problema do artista de sucesso que é esquecido. O mais incrível,
infelizmente, é que grande parte desse texto permanece atual.
O
jornalista começava com “a morte de Waldir Calmon traz à baila o problema do
músico que conhece grande sucesso e depois permanece na luta, mas fora dos
grandes esquemas comerciais e promocionais.” De fato, meu pai teve um pique de
enorme sucesso que durou cerca de dez anos e, até sua morte, manteve-se fiel a
seu estilo, tocando para dança, mas fora da grande mídia. Ele fazia algumas
aparições na TV, no entanto de forma esporádica, e não tocava mais no rádio com
tanta frequência. Mesmo assim, continuava tocando todas as noites, em casas
noturnas e nos famosos bailes, lutando contra os modismos que surgiam a cada
época.
Um
artista, quando faz sucesso, quer aproveitar a boa fase e assume compromissos
nas TVs, rádios, casas de shows, revistas... Acaba sem tempo para dar
continuidade a seu próprio trabalho, gravando um novo
e bom disco ou produzindo um show mais elaborado. Sem a qualidade que o ócio
criativo realmente proporciona, ele dificilmente conseguirá consolidar a sua
carreira e, em breve, será substituído por outro que entrará no mesmo esquema,
na mesma roda-viva.
Um dos pontos mais polêmicos abordados por Arthur da Távola, em
1982, é a interpretação da preferência do mercado pelas gravadoras. Mais de
trinta anos depois, esta prática ainda continua. Como é feita esta avaliação? Como
é possível o diretor de uma gravadora, um burocrata da música, avaliar o que é
melhor para o público se, muitas vezes, não tem sequer um contato direto com
ele? O público não gosta de algumas coisas ou simplesmente não conhece algumas coisas?
As regras do mercado são duras e, com a chegada da internet,
ficaram mais agressivas. A revolução tecnológica fez com que todos pudessem ter
uma chance. Antes, o artista devia passar pelo crivo de uma gravadora (caso
tivesse a sorte de conseguir mostrar o seu trabalho a uma gravadora). Agora, deve
passar pelo crivo dos internautas em meio a centenas de outros artistas que
também desejam mostrar o seu trabalho. Se a tecnologia democratizou as chances
do artista, também aumentou a concorrência e, em meio a tantos, como se
destacar? Além disto, em sua maioria, o público que acessa a internet tem uma
faixa etária mais baixa. Qual o tipo de mídia um artista, que desenvolve um
trabalho fora dos padrões da garotada e saia do eixo rock-sertanejo-funk,
deveria usar? Algumas pessoas dizem que a MPB está passando por uma grave crise
e que a nova geração é pouco talentosa. Não creio. Apenas acho que ainda não
foram descobertos no meio desta enxurrada.
Quem não aprecia este tipo de música imposto pelo mercado é
obrigado a procurar rádios alternativas e existem algumas até muito segmentadas
na internet. Mesmo assim, é difícil encontrar emissoras de rádio que toquem
Nelson Gonçalves, Jamelão, Altamiro Carrilho ou Dalva de Oliveira, por exemplo.
A questão de preservarmos a história de nossa música popular como parte da
memória nacional é importante, pois, sem educarmos nossos ouvidos, como
criaremos um senso crítico musical? Além disto, trata-se da formação da cultura
de um país relativamente novo, como o Brasil, pois muitas canções, através de
suas letras, estruturas melódicas e ritmos, são verdadeiros relatos de uma
época.
Em tempos de crise, tudo piora sensivelmente, pois a busca por
patrocínio se torna uma luta inglória e os shows seguem quase vazios. No Rio de
Janeiro, onde moro, muitas casas noturnas fecharam ou estão para fechar por
causa da violência – as pessoas têm receio de sair de casa à noite - e da queda
do padrão de vida de seus frequentadores - que tentam economizar no lazer. Com
este panorama, o mercado de trabalho para quem vive da arte se torna cada vez
mais restrito. Bem, enquanto estamos discutindo possíveis soluções, o artista,
como escreveu Arthur da Távola há quase quarenta anos, “permanece na luta.” E
que luta!
O título deste post foi inspirado na música E Vamos à Luta, do genial compositor Gonzaguinha. No vídeo acima, de 1981, ele canta Fala Brasil e E Vamos à Luta com Roberto Ribeiro no programa Luiz Gonzaga do Nascimento Junior, exibido pela TV Globo.
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